Açúcar, etanol, biomassa, ração animal e cachaça: o que eles têm em comum? Todos são produzidos na usina de cana-de-açúcar, estrutura industrial onde ocorre a moagem e toda a transformação da cana em outros produtos.
Antes do início desse processo, a cana-de-açúcar é cultivada em canaviais até o momento da colheita, quando é realizado o corte.
Para que a planta consiga desenvolver de forma saudável, o controle de pragas, doenças e plantas daninhas é fundamental.
Existem várias formas de realizar esse controle. Uma delas é pela aplicação de agrotóxicos, que exige diversos cuidados para ter mais eficiência e segurança.
Neste artigo, vamos explicar de forma simples como é o cultivo de cana-de-açúcar no Brasil e quais são os cuidados e particularidades que a cultura possui.
Depois, vamos apresentar as duas estruturas fundamentais para a produção da cana-de-açúcar — o canavial e a usina de cana-de-açúcar — e, por fim, explicar como uma aplicação de agrotóxicos segura exige a emissão do receituário agronômico.
Vamos lá?
Continue a leitura para saber mais!
O que é a cana-de-açúcar? Qual é a sua origem?
A cana-de-açúcar é uma planta do gênero Saccharum, conhecida pelas folhas longas e pelo caule (colmo) fino, cilíndrico e com nós bem marcados. É uma gramínea e faz parte da mesma família (Poaceae), que também tem plantas como milho e trigo.
Com a migração humana, a cana-de-açúcar se espalhou da Oceania – precisamente, do local onde está a atual Ilha de Nova Guiné da Austrália, onde foi sua origem – para os outros continentes do globo.
Foi nas regiões de clima tropical e subtropical, como no sudeste asiático, que a cana-de-açúcar encontrou um habitat ideal para se desenvolver. Nestes locais, a primeira espécie de cana-de-açúcar (Sachharum officinarum) cruzou com outras espécies silvestres que, então, resultaram em híbridos.
Quais são as espécies de cana-de-açúcar existentes?
Desse modo, a partir dos cruzamentos entre diferentes canas-de-açúcar, chegamos às atuais cinco espécies que temos hoje.
São as seguintes:
- Saccharum officinarum: é adequada ao clima tropical e possui colmos altos, grossos e baixo teor de fibra. É a mais popular para cultivo comercial, já que possui alto teor de sacarose.;
- Saccharum spontaneum: possui colmos curtos finos e fibrosos. Como possui teor de açúcar baixo, não é cultivada para fins comerciais;
- Sachharum sinense: espécie comum no leste asiático, em especial na China e Japão. Seus colmos são finos e seu teor de açúcar é médio;
- Saccharum barberi: é a espécie mais rústica da cana-de-açúcar. Os colmos são estreitos, fibrosos e o teor de açúcar é baixo. É resistente ao frio;
- Saccharum robustum: os colmos são grossos, fibrosos, com baixo teor de açúcar e dentre as espécies de cana, são os que podem atingir a maior altura (até 10 metros).
Como foi o início da produção da cana-de-açúcar no Brasil?
A cana-de-açúcar foi introduzida no Brasil ainda no período colonial, no século XVI. A planta começou a ser cultivada na Capitania de São Vicente (que hoje, estaria localizada na região sudeste); no entanto, não encontrou um ambiente propício para se no local.
Foi na atual região nordeste, em especial nas capitanias de Pernambuco e Bahia, que os engenhos de açúcar — antigos estabelecimentos que realizavam toda a produção da cana — prosperaram. Com o passar do tempo, no final do século XVI, o Brasil inclusive passaria a monopolizar a produção mundial de açúcar.
Como é atualmente a produção da cana-de-açúcar no Brasil?
Hoje, mesmo em uma realidade completamente diferente da época, o Brasil continua se destacando no cenário internacional de produção de cana-de-açúcar.
Líder na produção mundial, a estimativa de produção brasileira para a mais recente safra (2022/2023) de cana-de-açúcar, conforme expectativa da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), está para 598 milhões de toneladas.
Diferentemente do período da colônia, a maior parte da produção de cana-de-açúcar no Brasil se concentra hoje na região sudeste, especialmente em São Paulo e Minas Gerais, e na região Centro-Oeste, nos estados de Goiás e Mato Grosso do Sul.
Essa produção — ou seja, todo o processo que envolve o plantio, cultivo e colheita da cana-de-açúcar — ocorre nos canaviais, nome que se dá às plantações de cana.
De lá, as canas serão transportadas para a usina de cana-de-açúcar, onde serão moídas e posteriormente transformadas em diversos produtos.
Vamos explicar mais sobre as duas estruturas abaixo. Continue acompanhando a leitura!
Como é o cultivo de cana-de-açúcar no Brasil?
Como explicamos anteriormente, o cultivo de cana-de-açúcar para fins comerciais ocorre nos canaviais.
No Brasil, existem safras diferentes para duas macrorregiões:
- Centro-sul (regiões Centro-Oeste, Sul e Sudeste): abril a novembro;
- Norte-nordeste: setembro a março;
Você pode notar que os períodos das duas safras se complementam (o fim da safra Norte-Nordeste é no mês anterior ao início da safra do Centro-Sul). Dessa forma, o Brasil produz cana-de-açúcar durante todo o ano, o que beneficia a produção de açúcar e etanol, os principais produtos da planta.
Assim como toda cultura, a cana-de-açúcar possui suas próprias particularidades no cultivo. Duas delas são os cortes e épocas de plantio, que iremos explicar a seguir.
Cortes
A cana-de-açúcar é uma cultura semiperene — ou seja, até ser replantada, necessita de várias cortes. A atividade é necessária para melhorar a produtividade da cultura (afinal, a cada corte, os colmos são direcionados à usina de cana-de-açúcar para a transformação em produtos).
O corte pode ser realizado de maneira manual ou mecanizada. Isso acontece até o fim do ciclo produtivo da cana-de-açúcar, que geralmente dura seis anos. Neste período, costumam ser realizados cinco cortes.
Época de plantio
O plantio de cana-de-açúcar é feito por meio de mudas. Existem três épocas para tal:
- Cana de 12 meses (cana de ano): o plantio da cana-de-açúcar é realizado do início da estação chuvosa (outubro a dezembro), pouco tempo após a última colheita. A produtividade é mais baixa;
- Cana de 18 meses (cana de ano e meio): o plantio da cana-de-açúcar ocorre entre janeiro e março. A cultura tem de 15 a 18 meses para se desenvolver até o primeiro corte. É uma opção com alta produtividade;
- Cana de inverno: é uma opção de plantio para canaviais com sistemas de irrigação, já que a época (inverno) não é a ideal para o desenvolvimento da cana-de-açúcar. Como é possível controlar o nível de água do solo, a produtividade já é alta no primeiro ano.
O que é e como funciona a usina de cana-de-açúcar?
A usina é uma estrutura industrial onde a cana-de-açúcar será transformada em outros produtos.
Podemos dividir as usinas de cana-de-açúcar em três tipos:
- Usina de açúcar: produz apenas açúcar;
- Usina de açúcar com destilaria anexa: produz açúcar e bioetanol (etanol de origem vegetal);
- Usina de álcool (destilaria): produz apenas bioetanol.
O processo produtivo para os dois produtos principais da usina — a cana-de-açúcar e o etanol — começam com as mesmas etapas:
- Moagem da cana-de-açúcar, para extração do caldo de cana (garapa);
- Extração das impurezas do caldo de cana, para retirada de sólidos insolúveis (areia, argila, entre outros);
- Tratamento químico do caldo de cana, remoção de sujeiras que não saíram na primeira extração de impurezas e correção do pH.
Após essas etapas, caso a produção seja de açúcar, é realizado o processo de evaporação, em que ocorre a transformação do caldo de cana em um xarope concentrado.
Depois, há uma nova etapa de aquecimento – cozimento – para realizar o processo de cristalização. Desse modo, o até então xarope vira uma massa que depois será centrifugada e, então, irá para o processo de secagem.
Já para a produção de etanol, depois do tratamento químico, o caldo de cana segue para as etapas de fermentação, destilação, desidratação e armazenamento.
Além do açúcar e do etanol, também são produzidos produtos como:
- Caldo de cana (da primeira moagem): açúcar, rapadura, melado de cana;
- Caldo de cana (fermentado e proveniente das moagens seguintes): etanol, cachaça;
- Bagaço, folhas e outros resíduos: energia biomassa, ração animal, bioplástico, cola;
- Vinhaça (resíduo da destilação do etanol): fertilizantes;
- Torta de filtro (resultante da filtração do iodo que sai dos decantadores do caldo): fertilizantes;
Por isso, dizemos que a cadeia produtiva da cana-de-açúcar é circular, já que é possível aproveitar toda a planta.
Como fazer o controle de pragas e doenças na cana-de-açúcar?
Ainda no canavial, um ponto importante para o desenvolvimento da cana-de-açúcar é o controle de pragas e doenças.
De forma geral, o que se recomenda para todas as lavouras é que a aplicação de agrotóxicos seja a última opção para esse controle.
Por isso, é importante realizar o planejamento e, posteriormente, o monitoramento eficiente durante o desenvolvimento da cana-de-açúcar. Assim, é possível identificar pragas e doenças ainda no início da infecção e fazer o controle com outras estratégias além do uso de agrotóxicos.
Uma forma de definir esse controle é com base no Manejo Integrado de Pragas (MIP). Este é um sistema que associa o contexto ambiental da lavoura e a dinâmica populacional da espécie para determinar o método de controle ideal para pragas e doenças da plantação.
Como fazer uma aplicação de agrotóxicos segura na cana-de-açúcar?
Em um contexto em que a aplicação de agrotóxicos é imprescindível, é necessário estar atento a algumas regras e cuidados para garantir que a pulverização irá ocorrer de forma segura.
Neste contexto, vale ressaltar que nos referimos à segurança como um todo:
- Da região ao redor do canavial;
- Dos profissionais que trabalham diretamente com o canavial;
- Das pessoas que irão consumir os produtos manufaturados na usina de cana-de-açúcar.
Sendo assim, selecionamos 3 pontos fundamentais para uma aplicação de agrotóxicos segura na cana-de-açúcar:
- Emissão do receituário agronômico;
- Recomendações técnicas da receita agronômica;
- Preparo da calda.
Receituário agronômico
Antes de tudo, é importante destacar que antes de qualquer aplicação de agrotóxicos na cana-de-açúcar, é preciso que um profissional habilitado prescreva o uso do produto por meio do receituário agronômico. Este é um documento obrigatório para o comércio e uso de defensivos agrícolas no país.
No caso, esse profissional habilitado que irá prescrever a receita agronômica deve ser, por lei, um engenheiro agrônomo, engenheiro florestal ou técnico agrícola.
Receita agronômica por diagnóstico
O processo habitual de emissão do receituário agronômico acontece após o diagnóstico da lavoura pelo responsável técnico.
Após o profissional identificar qual o problema — no caso, do canavial —, ele então prescreve na receita agronômica qual será o produto e o modo de aplicação para o controle da praga ou doença.
Esta análise é importante porque para a aplicação de um agrotóxico, é preciso considerar uma série de questões, como:
- Condições meteorológicas (temperatura, umidade relativa do ar e velocidade do vento) e ambientais durante a época e momento de aplicação;
- Terreno do canavial (presença de declives, que podem atrapalhar a pulverização mecanizada);
- Presença de reservas legais, mananciais de captação de água e áreas de proteção ambiental na região;
- Proximidade de áreas povoadas (como cidades, vilas e agrupamentos humanos);
- Presença de agrupamentos de animais próximo à lavoura;
- Aplicação pré-emergência ou pós-emergência;
Todos esses pontos interferem no tipo de produto que será aplicado e no modo como isso será realizado.
Sendo assim, após analisar todas essas questões, o responsável técnico emite a receita agronômica com as informações do agrotóxico, o diagnóstico, as recomendações técnicas e demais precauções de uso.
Para ter uma visão completa sobre essas informações, confira aqui nosso artigo sobre receituário agronômico.
Receita agronômica a cada aplicação
Outro ponto que precisamos ressaltar: é preciso emitir uma receita agronômica a cada aplicação de agrotóxico no canavial.
Na prática, isso significa que mesmo após a compra do agrotóxico, na qual é obrigatoriamente emitido a receita agronômica, e do diagnóstico, é necessário prescrever um novo receituário agronômico a cada aplicação do produto.
Esta é uma questão importante quando consideramos que é comum agroindústrias comprarem produtos agrícolas com antecedência, de forma preventiva e em grande quantidade, conforme o histórico do canavial. Este é um processo que chamamos de emissão preventiva de receita agronômica.
Inclusive, há órgãos de defesa agropecuária, como a Agência Goiana de Defesa Agropecuária (Agrodefesa) em Goiás — o segundo estado com maior produção de cana-de-açúcar no Brasil — que possuem uma legislação específica sobre esse tipo de receita agronômica.
Recomendações técnicas da receita agronômica
Por ser uma prescrição de uso do agrotóxico, a receita agronômica contém recomendações técnicas para a aplicação do agrotóxico, como:
- Quantidade total do produto a ser adquirida;
- Dosagem do produto (mililitro por hectare);
- Intervalo de segurança (o tempo que deverá transcorrer entre a aplicação do agrotóxico e a colheita, uso, consumo ou plantação do próximo cultivo);
- Taxa de aplicação (litros de calda por hectare);
- Modalidade de aplicação (terrestre ou aérea);
- Modo de aplicação (forma de aplicar a calda via pulverizador);
- Equipamento de aplicação;
- Bicos de pulverização;
As informações sobre o agrotóxico são provenientes da própria bula ou do rótulo que acompanham o produto.
Já as recomendações técnicas, por sua vez, devem estar de acordo com o diagnóstico, o histórico e a região do canavial.
Preparo da calda
A calda é a mistura do agrotóxico no diluente (água). Em alguns casos, é preciso adicionar um adjuvante agrícola, para melhorar o desempenho de defensivo nas pulverizações.
Para preparar a calda, é preciso seguir as recomendações técnicas, que estão disponíveis na receita agronômica.
De forma geral, essas são algumas das regras para ter segurança neste processo:
- Uso de Equipamentos de Proteção Individual (EPI);
- Preparo da calda em local sombreado, aberto e com boa ventilação;
- Evitar inalação e qualquer contato com os produtos;
- Utilizar equipamentos exclusivamente para o preparo da calda (balanças, copos graduados, baldes e funis);
- Lavagem de utensílios após o preparo da calda, além de levá-los para secar ao sol.
Conclusão
Neste artigo, você aprendeu, de forma geral, como é a produção de cana-de-açúcar no Brasil.
O país hoje é o maior produtor da cultura no mundo. Na usina de cana-de-açúcar, fabrica diversos produtos para os mercados interno e externo.
Para que esses produtos sejam seguros para consumo, é fundamental que o controle de pragas, doenças e plantas daninhas durante o desenvolvimento da cana aconteça da forma apropriada.
Neste cenário, temos o receituário agronômico, documento com a prescrição de uso do agrotóxico. Ele é obrigatório para o comércio e aplicação de defensivos agrícolas, pois contém recomendações técnicas e orientações para uma aplicação segura de agrotóxicos.
Gostou deste conteúdo? Aproveite e leia nosso artigo sobre defensivos biológicos.
Jornalista e Analista de Conteúdo no Conexa, hub de inovação da Aliare.
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